12.9.08

O 11 de Setembro Chileno no DVD La Batalla de Chile


No dia 11 de setembro de 1973 foi deposto Salvador Allende, presidente eleito democraticamente . Deveria ter postado este texto ontem, mas demorei a encontrá-lo no meu desktop. Foi uma pensata que escrevi numa outra ocasião acerca de um filme importantíssimo chamado "A Batalha do Chile" de Patrício Guzmán.
O filme mostra toda a luta que se travou até a esse 11 de setembro longínquo. É uma verdadeira aula de documentário político. Não só é didático, como serve de alerta para todos: humanistas , democratas e ou os que estão em dúvida em relaçao à validade da prática política dentro da legalidade entenderem como funcionam os podres poderes nesta América tão longe de Deus e tão perto dos Estados Unidos (como disse um dia a propósito do México, Porfírio Diaz). Serve para que não se repita uma história que foi tão trágica. Que ela não se repita nem como farsa, justamente agora em que outros representantes do povo, mais próximos da esquerda chegam ao poder como Evo Morales, na Bolívia, Tabaré Vázquez, no Uruguai e mesmo (por que no?) Chavez (com todos seus defeitos, seu populismo, personalismo e tudo mais) mas que, não esqueçamos, foi eleito democraticamente e golpeado pelos americanos e a mídia de seu país e submetido a referendos e plebiscitos que venceu sob os olhos de fiscais de todo mundo inclusive de Jimmy Carter (este ex-presidente americano que me parece um democrata- um dos raros a defender os direitos humanos no bizarro mundo de Bush). Ao mesmo tempo, não podemos dizer que Cristina Kirchner seja de direita e Lula, apesar de ter dito que não era de esquerda, nela se apoiou para chegar ao poder. E recentemente o Paraguai elegeu Fernando Lugo que segundo o jornal inglês "The Daily Telegraph" completa o "tunsmi vermelho" que invadiu a América do Sul, sem esquecer da Nicarágua onde se elegeu um Daniel Ortega mais moderado.


“A batalha do Chile” segue passo a passo a evolução dos acontecimentos que quebraram a legalidade democrática naquele país , chegando ao caos e ao golpe de Estado que como todos sabem levou Pinochet ao poder, ao banho de sangue e tortura de campos de concentração como o do Estádio Nacional onde o compositor Victor Jara teve suas mãos quebradas antes de ser assassinado. O mesmo Estádio Nacional que viu a vitória do Brasil recentemente sobre o selecionado chileno. Quem viu o filme “Missing” de Costa-Gravas,( com Jack Lemmon, no papel de Ed Horman um pai que procura desesperadamente seu filho perdido num Chile cheio de cadáveres e Sissy Spacek no papel de Beth , sua nora) tem uma idéia do horror que foram aqueles dias depois do golpe (Este filme foi baseado em fatos tenebrosos). Já o documentário de Guzmán nos revela os dias que antecederam o horror. Nos mostra de perto a história daqueles dias de 1973, coisas que a gente só sabia de ler nos jornais (vivíamos numa ditadura entonces) ou de ouvir relatos muito tempo depois através da boca daqueles que conseguiram escapar, se refugiando em embaixadas estrangeiras e falaram no exílio das barbaridades que aconteceram em sua terra. De qualquer forma as imagens desse documentário nos jogam de novo diante do ovo da serpente. Vemos como se gera um golpe. Esse “documento” já se encontra nas boas locadoras em 2 vídeos. Nele está aquela famosa cena em que alguns cães de aluguel de um grupo de militares golpistas atiram e matam o cinegrafista argentino Leonardo Henricksen que filma sua própria morte. Eram os soldados rebelados que naquele momento participavam da primeira tentativa de ataque ao palácio La moneda, perpetrado pelo Regimento Blindado nº 2 que aconteceu às 9h10 da manhã do dia 29 de junho de 1973, quando seis tanques e alguns veículos com homens armados até os dentes cercam o palácio presidencial e iniciam uma luta na qual morreram 22 pessoas. Isso aconteceu dois meses antes do golpe de Estado que pôs fim ao sonho de um socialismo pela via democrática. Guzmán tem também o mérito de mostrar as divisões dentro da esquerda (acho que já vimos várias vezes esse filme na AL?). O que impressiona é que alí estava acontecendo a história de um povo, aquele povo que estava dividido. Vemos a conspiração se realizar nos pormenores. Os meios de iludir as pessoas, a manipulação, o boicote, as greves patronais para derrubar um representante popular democraticamente eleito que num último momento tentou salvar a nação e uma parte considerável de seu povo num diálogo infelizmente fracassado com um partido de grande representação que era a Democracia Cristã . Um homem corajoso como Salvador Allende que chegou a propor um plebiscito, mas teve seu palácio bombardeado em 11 de setembro, resistiu e morreu. Dizem que se suicidou.
Mas o que impressiona é ver isso acontecer nesse filme dia a dia. O que nos aflige é saber que aquelas pessoas vão realmente morrer no final ou padecer nas mãos de seus algozes.O filme choca, não nos deixa indiferentes. Não é por outro motivo que ele foi indicado entre os 5 melhores filmes do 3º mundo do período de 67/78 pela revista Take One (EUA); entre os 10 melhores filmes da América Latina no período 70/80 pelos críticos de Los Angeles (EUA); entre os 10 melhores filmes políticos do mundo da Revista “Cineaste” dos Estados Unidos no período de 67/87. Ganhou também em 1976 o Prêmio “Novas Teixeira” da Associação dos críticos cinematográficos da França, em 1975 Grande Prêmio do Festival Internacional de Grenoble, o grande prêmio do Júri do Festival Internacional de Leipzig em 1976, O grande prêmio di Festival de Grenoble em 1976 e do Festival de Bruxelas em 1977 e do Festival Internacional de Benalmádena na Espanha em 1977 e o grande prêmio no Festival Internacinal de Havana em 1979.


Em 1973, eu estava no último período do curso de Sociologia, no dia 11 de setembro daquele ano, diante de um rádio potente buscava com amigos notícias de Santiago do Chile. A noite chegou e as coisas iam de “mao a piao” como se dizia na época. Num determinado momento o locutor informou que o general Pratts em algum lugar estava organizando a resistência…As notícias sobre a morte de Allende pareciam um boato disparatado. Depois de muitos informes desencontrados, o locutor afirmou que tudo era muito nebuloso…Nos primeiros meses foram executados 1500 prisioneiros pelos golpistas, informam relatos recentes. Aos poucos percebemos que a grande esperança daquela época de trevas chegara ao fim, estavamos cercados por ditaduras por todos os lados. Minto, na Argentina Perón ainda vivia um governo ambíguo e o desastre apenas se anunciava. Nos Andes havia uma “revolucão de esquerda” no Peru”. Numa viagem que fiz em 1974 a este país, para ver a tal experiência do general Juan Velasco Alvarado, encontrei vários jovens de todas as parte do mundo, um deles que passou por Santiago disse que a situação estava calma. Me lembro de que um garoto argentino fez uma piada de humor negro : disse que estava calma como um cemitério. Mal sabia ele que seu país iria mergulhar num regime que teria mais de 20 mil desaparecidos.
Logo que se instalou no poder, ao que parece, Pinochet e seus comandados trataram também de eliminar fisicamente homens da oposição que se encontravam fora do país. O general Pratts morreu em um atentado a bomba no dia 30 de setembro de 1974 na Argentina, junto com sua mulher Sofía Cothbert.Agentes da polícia política de Pinochet (DINA) foram acusados.Em Washington, Orlando Letelier (ex-chanceler de Allende)também sofreu um atentado que resultou na sua morte e de sua secretária Ronni Moffiti. Parece que lá as forças ocultas se deram mal e um agente, Michael Townley, foi preso e parece que se revelou a conexão da CIA com a DINA num dos terminais da famosa “Operação Condor.” Na mesma época, em Roma houve um atentado à bala contra Bernardo Leighton do Partido Democrata Cristão do Chile. Atualmente Pinochet está sendo acusado de corrupção, depois de ter escapado das mãos de um juíz espanhol que o queria como num tribunal internacional por crimes contra a humanidade. Escapa atualmente de 9 processos relacionados a tuma tal "Operação Colombo", como foi batizada a eliminação de 119 pessoas da oposição atribuidas a lutas intestinas do movimento armado MIR (Movimento de Esquerda Revolucionária) Pinochet mandou e desmandou no Chile de 1973 a 1990. Nesse tempo de trevas , liquidou 3 mil pessoas e torturou 28 mil, dizem que dormia muito bem na sua prisão domiciliar. Um escritor de crônicas fora do lugar disse que Pinochet quando morrer se for para o inferno estará num lugar confortável cujo modelo ele, de certa forma ajudou a criar.

Hoje,uma mulher de esquerda, Michelle Bachelet, governa o Chile.
Por essas e outras vale a pena ver esse documentário, nele estão as últimas palavras de Allende. Creio que primeiro num texto onde parece, ele escreveu seu testamento político :”Eles têm a força. Poderão nos avassalar, porém não se detêm os progressos sociais nem com o crime, nem com a força. A história é nossa e a fazem os povos. Sigam sabendo vocês que muito mais cedo do que tarde de novo se abrirão as grandes Alamedas por onde passará o homem livre para construir uma sociedade melhor. (11/09/1973)
No rádio , dentro do palácio presidencial bombardeado pela força aérea chilena e cercado por tanques ele disse:…Só tenho a dizer aos trabalhadores que não vou renunciar. Colocado pela história nesta situação pagarei com minha vida a lealdade do povo. A história é nossa e feita pelos povos.
Viva Chile! Viva o povo! Vivam os trabalhadores! …"

(Salvador Allende morreu às 14h15)


Às 21 horas, os chefes da sublevação mostraram suas caras na TV. Estavam numa mesa e falaram O General Augusto Pinochet, o Almirante José Toribio Merino, o General César Mendoza e Gustavo Leigh. A cena é bastante gráfica ,se é que isso diz alguma coisa,mas se o ódio precisasse de uma represtantação pictórica,ele alí estava nos seus melhores momentos.

4 comentários:

Anônimo disse...

Vi um filme, fazem uns dois anos, sem a força de denúncia da Batalha do Chile, é claro. "Madruga" ele se chama. Sensível, meio auto-biográfico, serviu pra contar pros meus filhos (a nova geração precisa de outros planos de discurso) como foi triste deparar com o fim das esperanças democráticas na América Latina daquela época. A recorrência da imagem da queda das torres gêmeas, também no 11 de setembro, esvazia a lembrança da história trágica do Chile de 73. E ainda serve de justificativa pra truculência do governo Bush no Iraque e nas prisões de Guantânamo. Tenho verdadeiro horror da face-fascista de Pinochet nas fotografias. É impressionante o que seu olhar evidencia. Tenho horror também do Bush. Sempre!

LIBERATI disse...

É isso aí, Rosa. O 11 de setembro chileno tem que ser lembrado sempre, para que não se repita. Para mostrar ao mundo o terror que impuseram a um país de nuestra América que um dia sonhou com o socialismo democrático.
As fotos de Pinochet e seus asseclas são tremendas, no sentido de mostrar a face demoníaca, raivosa, monstruosa ameaçadora desses homens que se assemelham mais às uma gravura mais sombrias de Goya.Foram eles que numa época destruiram milheres de pessoas e transformaram em pesadelo os sonhos libertários deste continente. É bom que se lembre sempre deste 11 de setembro, para que as novas geracões conheçam e não vejam estes graves fatos como algo que se passou em outro planeta.
bjs
Obs: Bush é um bufão mentiroso. A vice do candidato republicano MacCain anda falando numa guerra contra a Rússia. Olha que perigo! Esta gente é perigosa! O mundo não pode ficar refém dessa loucura! Tenho receio de que Obama veio cedo demais para a cuca do americano médio e os Republicanos emplaquem de novo.
Vamos torcer para que não aconteça.

ze disse...

9 de setembro nos altares católicos de toda América (de sul a norte) é celebrada a festa de s. Pedro Claver que viveu na época de Antônio Vieira aqui no Br., lá na Colômbia em Cartagena - séc. XVII. Ele tentava cuidar dos negros que chegavam nos barcos vindo da Africa aos roldões nas costas deste nosso continente. Vieira também tentou fazer o mesmo. O primeiro não tinha a oratória do segundo. Cuidava também dos indígenas. A idéia me parece é que a sociedade necessita cuidado. A economia-política é cruel. E alguém mal ou bem precisa cuidar das pessoas. O mal é o vil metal. felicidades.

LIBERATI disse...

Que bom que tem gente que se preocupou com os homens que foram arrancados de suas terras e escravizados nas Américas.Os pobres, os marginalizados, os excluídos esperam que alguém os proteja e hoje só exploram mais esta carência. Muita política de fundo de quintal cresce em cima dos expropriados.Podres poderes deste mundo.
Grande abraço