21.3.08

Paz & Amor , um conto hippierealista


(Esta história é real em parte, hippierealista, melhor dizendo. É uma das que mais gosto. Ouvi na minha pesquisa sobre o fim dessa era cheia de flores e de calcanhares sujos de pés que calçavam sandálias humildes de sola de pneu.)
É isso aí, bicho, dos anos 60 aos 70, costuma-se dizer que rolou de tudo. Não quero nem lembrar,e mesmo que quisesse, meu camarada, não ia dar pé. Bateu um sudoeste na minha memória “mermão”. Mas, cara, acho que o anti-barato dessa época aqui no Patropi foi que o pau comeu na casa de Noca, foi uma dieta-dura militar que não deixou saudades. Sai de baixo! Tem nego que foi e não voltou, teve nego que tomou um táxi na praia de Copacabana, saindo do “pier” e disse: -Toca pro Recife! Pois é, malandro, foi uma era “já –era” de experimentalismo tanto químico como místico. Tinha o Carlos Castañeda e sua erva do diabo e um índio que baixava e a doutrina de que você deveria achar o seu lugar no mundo,o seu ponto místico geográfico, coisas assim, etc e tal ou não. Teve Woodstock e tudo mais e o hino americano explodindo na guitarra de Jimi Hendrix. No meio daquelas cabelos encaracolados, bandanas, roupas espalhafatosas, cheias de desenhos “lisérigicos”, florais e tendendo sempre para espirais , camisetas feitas artesanalmente com anilina com calças boca de sino, muito Are you experienced? e Janis Joplin tocando sem parar na vitrola que Carlão do violão conheceu Soninha da flauta. Na flauta mesmo ela só tocava “Greenleaves” e adorava aquele filme sueco Elvira Madigan em que a heroina morre comendo flores se não me engano. A união dos dois pombinhos rolou numa praia, teve troca de alianças na qual resolveram ter um casamento aberto….Eram tão datadamente hippies que seus amigos os chamavam, ele de Paz e ela de Amor . Concordavam em tudo, inclusive no time, o Fluminense, que era a única caretice que ele cultivava, ela torcia em solidariedade.
Paz & Amor, O casamento perfeito. Um casamento que começou aberto e acho que terminou escancarado. Enquanto durou, eles curtiram adoidado contar como foi com os outros com os quais dividiram a cama. Nada de promiscuidade. Não. Isso não rolava. Não curtiam um “ménage à trois”, mas transavam à vontade com parceiros que encontravam em noitadas, acampamentos, ou em bares onde pintava de tudo inclusive um sujeito que só bebia coca-cola e um outro que olhava detalhadamente uma caixa de fósforos e dizia:- Gêeenio!
A química era essa: Carlão, ou melhor, “Amor”, se excitava com as aventuras sexuais dela e ela idem, idem e o relacionamento deles esquentava pra valer. Mas o diabo sempre se mete no meio desses relacionamentos felizes e um deles apareceu e botou um sujeito bacana demais na vida de “Paz”. Como se disse depois, o cara parece que tinha pegada . “Amor” nem desconfiou, deliciado em saber como foi que o tal bacana fez “Paz” ver o céu, meu bem e o seu amor também. Surfou na rebarba, feito mané-gostoso até que num domingo, ela disse que tinha que sair mais cedo pois ia ao Maraca ver um jogo do Mengão. Do Mengão? –Que é isso, “Paz”? Você mudou de time?
- Não, é que o cara bacana que eu encontrei torce pro Flamengo. Sabe como é, essas coisas, etc e tal…
Nesse exato momento ele percebeu que o sonho tinha acabado e Santa Teresa nunca mais seria a mesma.

4 comentários:

ze disse...

é um escândalo! o pessoal do D. Juan, Sílvio Manuel, d. Genaro, e toda a 'Igreja Mexicana', guardavam a castidade. Não transavam. Paz e Amor.

TS disse...

O conto pode ser hiperrealista... mas a ilustra é cubista-surrealista brasileira: tipo Ismael Nery.

Santa Tereza está mais para N. S. de Guadalupe, sempre carregada de flores...

Amor e Paz.

notinha: esse papo de "casamento aberto" não existe: é, ou não é. O resto era "amizade colorida" - céus!

LIBERATI disse...

Transar é uma gíria dos anos 70. Paz e Amor um slogan que veio em função de combater a guerra do Vietnam. O Brasil vivia uma situação muito ruim nesta época. O hippismo aqui estava mais ligado a uma tentativa de viver fora do sistema, mas era também uma espécie de revolta. Eram chamados de desbundados pelos militantes. Não colou por estas bandas. Nos EUA um braço do hippismo virou político o partido Yippie. Acho que Norman Mailer falou dele num livro e eu botei neste blogue a plataforma deles. Faça uma pesquisa nos arquivos e você vai achar.
Grande abraço

LIBERATI disse...

Querida Tinê, o conto se baseia num fato. Aconteceu no tempo da psicodelia. Hoje, acho que já não é mais motivo para escândalo. Quantas formas de conjugalidade que existem e acontecem aparentemente dentro de uma certa "normalidade". A moral elástica da linha abaixo dos equador admitiu formas de conjugalidade que a gente nem imagina. E o governador de Nova Iorque, digo o atual que admitiu que traiu a mulher e ela confessou que fez o mesmo com ele. Existem casamentos como antigamente. Mas antigamente...Veja Gilberto Freyre, em Casa Grande e Senzala...O mundo vive num grande contubérnio faz tempo, vide Roma das orgias etc e tal...
bjs